segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Sobre ser homem

 

Tem sido difícil, nos últimos dias, ser homem. Essa frase pode soar esquisita do ponto de vista onde eu sou homem, hétero, branco e privilegiado. O problema está na dádiva do bom senso, e eu vou escrever aqui o porquê. Eu estou cansado de fingir ser um homem que eu não sou durante toda minha vida. Eu estou cansado de parecer forte quando me sinto fraco. Cansado de parecer confiante quando eu me sinto inseguro ou mesmo forte quando eu me sento triste. Eu estou cansado de fingir. E quer saber uma coisa? É cansativo fingir ser homem suficiente para todo mundo o tempo todo. 




Desde que eu era pequeno, a sociedade diferenciou muito bem o que é ser homem e o que é ser mulher. Desde pequeno ouvimos frases como “isso é coisa de mulherzinha” ou que determinada ação não era coisa de um homem. Ora, tudo que um garoto quer é ser aceito pela sociedade e por outros garotos, como se isso mostrasse esse pertencimento e isso significasse o homem que seríamos, e ser aceito pela sociedade como homem, era justamente fazer essa divisão do que era coisa de homem e o que não era. Era sobre aceitar a visão distorcida sobre o que a mulher significava. Sendo assim, nós meninos fomos ensinados a suprimir sentimentos que “naturalmente” seriam de mulher ou ser rejeitado por isso. Rejeitado por ser gentil demais, carinhoso demais ou simplesmente sentimental. Eu dou graças a Deus por ter sido criado majoritariamente pela minha mãe, que me ensinou que não tinha problema nenhum ter esses sentimentos agregados, mas mesmo assim a sociedade me jogou isso garganta abaixo. Não nos meus atos em si, mas no personagem que eu tinha que ser para me encaixar nessa sociedade, que naquela época que não sabia dar nomes, mas agora fica fácil classificar como machista. Eu tive muita sorte das minhas amizades não requererem provas de uma super masculinidade naquela época. Cresci num bairro legal, com pessoas legais, mas naturalmente você é corrompido em outros círculos e o personagem vai ficando mais convincente. Cada vez mais você age tentando provar esse rótulo de homem contrariando o que realmente está dentro de você. Como eu disse no início do texto, e eu como homem afirmo que isso é errado, é tóxico e chegou a hora disso acabar.

Como Keanu Reaves disse em entrevista “eu não quero viver num mundo onde ser gentil é um defeito ou motivo de piadas machistas”. Eu não quero me encaixar no padrão de masculinidade que existe hoje, porque eu não quero ser somente um bom homem, eu quero ser uma boa pessoa e, eu acredito muito que para isso acontecer, nós precisamos abraçar as qualidades que a sociedade nos disse que são qualidades femininas. Mais que isso, nós precisamos aprender com elas sobre como abraçar isso. Eu tenho certeza que, assim como eu, muitos homens se veem na mesma situação. De ter medo de ser o chato do rolê por corrigir o amigo, de não dar um toque quando alguém está sendo machista do seu lado, mesmo que você não conheça, ou melhor, mesmo se você conhecer bem. Mas como eu disse, eu cansei disso. Depois do que aconteceu nessa última semana ficou difícil permanecer em silêncio vendo tantas mulheres serem agredidas moralmente por que nós estamos com medo de nos posicionar. Eu não quero mais ser o cara que fica calado.

Se ser homem significa ser forte, que tenhamos força para levantar nossa voz e ir contra a nossa sociedade que ignora as mulheres quando são assediadas. Se ser homem significa ter coragem, que tenhamos coragem de corrigir um amigo na mesa de bar quando ele fizer uma piada machista. Se ser homem é ser confiante o bastante, que sejamos confiantes em abaixar a cabeça quando uma mulher nos disser como se comportar, por que aquilo pode estar machucando alguém. Eu sinto que chegou a hora de redefinir todas essas qualidades que acreditamos ser masculinas, para explorar nossos corações e entender que isso não nos torna melhor do que ninguém. Ser forte também é poder chorar e entender que está tudo bem. Ser corajoso é não ter medo de ser vulnerável e que, para ser confiante, não é necessário ser turrão, que também podemos ceder.

Dito isto, eu cansei de fingir. A partir de agora eu redefino todas as características que me fizeram crer que eu não seria homem por isso, e as abraço para fazer o mundo um pouco mais confortável. Deste momento, eu não vou me omitir mais e também não vou ficar calado. Não só pelo fato de não aguentar fingir ser o homem que o mundo estabeleceu, mas não aguentar mais ser passivo em um mundo onde as mulheres sofrem por um problema que nós homens causamos. Eu não quero que a próxima geração seja melhor, eu quero começar agora a fazer o mundo de hoje se tornar melhor para as mulheres.  Informação, leitura e ideias de como ser melhor nós já temos. Basta pôr em prática.